terça-feira, maio 31, 2016

O Segredo do Maior Sacrifício



Quero contar-te um segredo. Um segredo que não penso nunca vir a contar a mais ninguém e que permanecerá comigo até ao fim. Até ao meu fim.
Gostava de te contar sobre o sacrifício maior que fiz por alguém. Aquele passo mais além, aquele sacrifício que nos leva para lá da fronteira de uma simples amizade, de uma simples paixão; um pequeno gesto que marca duas vidas para toda a eternidade.
Pois bem, troquei dois cafés. Foi algo tão simples quanto isso. E ao mesmo tempo tão complicado como desvendar os mais insondáveis mistérios do Universo.
Troquei um café envenenado por outro, de modo a salvar a vida de uma pessoa que me odiava.
No seu lugar, outro veneno, mas não mortal, este apenas paralisa a vítima sem ela se aperceber. Continua a ver, a ouvir, a cheirar e a sentir, mas não se consegue mexer. Assim não poderá seguir-me no fim.
Quanto ao veneno mortal, em vez de ser bebido pela pessoa em questão, foi bebido por mim. Neste preciso momento ainda não sei se morri ou não. Penso que sim, mas quem sabe, talvez tenha tido a sorte de ter chegado a tempo ao hospital. Contudo, mesmo tendo conseguido sobreviver, sei que sofri muito, pois apesar de demorar a actuar, o veneno era poderoso.
E sabes o que tem graça em toda esta situação? A pessoa que salvei é uma ex-namorada que nunca deixei de amar e que estava a tentar suicidar-se à minha frente, pois achava que era a única maneira de eu a perdoar pelo mal que me fizera e pelo qual estava arrependida. Depois de ter bebido o café, despedi-me e fui embora, antes que ela pudesse perceber o que fizera e que o veneno fizesse efeito. Queria poupá-la a essa visão, pois apesar de ela nunca se ter apercebido, eu já a havia perdoado há muito. Talvez agora perceba, neste momento que lhe ponho ao lado o anel de noivado que comprara há vários anos e saio pela porta depois de lhe contar este segredo.

quinta-feira, maio 19, 2016

Companhia Nocturna



É noite lá fora. É fria, mas é também escura e silenciosa, como eu gosto. Só assim consigo ouvir os verdadeiros pensamentos da alma. Sento-me no chão em frente à lareira e olho o lume. As labaredas dançam hipnotizadas pelos meus olhos cheios de sonhos saídos da minha imaginação.
Crio mundos, crio vidas, crio universos inteiros sem fim, ao som crepitante da quente dança das chamas.
Atrás de mim, a casa enche-se de cores, sons, cheiros e movimentos de lugares que só existem dentro de mim. É um não acabar de uma infinidade de vida que me faz companhia e me aquece,
Mas elas apagam-se. E os meus universos, os meus mundos, as minhas vidas e criações apagam-se com elas. As chamas não me aquecem, mas a companhia sim. Quando ela se vai, volta o frio.
E eu fico sozinho na noite escura, com uma réstia de calor do outrora fogo companheiro de criação.